As finais de conferência da MLS trouxeram-nos dois jogos que surpreenderam tudo e todos, com os dois grandes favoritos à conquista do título a ficarem de fora da final. Mérito para os Seattle Sounders, uma equipa em excelente forma, muito organizada defensivamente e excelentes jogadores; e para os Toronto FC, que souberam corrigir erros durante o jogo, anularam as investidas de Atlanta e souberam finalizar as poucas chances que tiveram. Será, pela terceira vez em quatro anos, uma final entre Seattle e Toronto, com duas equipas que já sobreviveram a vários jogos de Playoff com intensidade, rigor tático e emoção ilimitada. A partir daqui irei referenciar muitos dos momentos e particularidades das duas finais que acabaram por decidir a narrativa dos dois jogos.
Conferência Oeste: LAFC – Seattle Sounders
Os favoritos de LAFC, orientados por Bob Bradley, foram surpreendidos com uma lição tática, profissional e experiente dos Seattle Sounders. Apesar do talento indiviudal disponível, as fragilidades de LAFC foram expostas, algo que raramente aconteceu durante a fase regular (exceção feita dos dérbis emotivos frente aos LA Galaxy). Uma derrota por 3-1 num jogo onde a equipa de LA foi incapaz de se envolver em processos ofensivos práticos e raramente conseguiu quebrar as linhas defensivas de Seattle, que se preparou muito bem para os diferentes momentos do jogo: sempre organizados defensivamente, assumiu o jogo com bola durante grande parte do 1º tempo sempre precavendo a perda de bola e foi mortífera nas transições ofensivas, resultando em golos.
Sem grandes surpresas, as equipas apenas efetuaram uma troca em relação às meias-finais. Os Sounders foram forçados a substituir o central Román Torres (lesão na coxa, entrou Arreaga) enquanto que em LA o central/médio Zimmerman entrou para a defesa, empurrando Blackmon para a lateral direita e substituindo Beitashour (teve uma prestação fraca contra os LA Galaxy).
Seattle veio para o jogo ao seu estilo: laterais bem subidos e a apoiar o ataque (predominância no lado esquerdo, com o australiano Bradley Smith a subir muito, e bem). Jordan Morris sempre a aparecer em zonas interiores e associar-se com Ruidiaz e o uruguaio Lodeiro como o jogador criativo do ataque: liberdade para se movimentar, aparece sempre no lado da bola e é quase um contra-senso que numa equipa tão forte taticamente, Lodeiro jogue quase como um 10 “à antiga”.
Um exemplo da assimetria tática de Seattle desde o início do jogo: a largura é oferecida pelo lateral esquerdo Smith e pelo extremo direito Jones. Por dentro, Morris-Lodeiro-Ruidiaz têm muita liberdade de movimentos. Quanto aos médios-centro, recuados e junto à defesa, não permitindo que LAFC ficasse 3vs4 na frente de ataque para as suas famosas transições.
LAFC nunca conseguiu afirmar o seu jogo ofensivo (transições rápidas lançadas e apoiadas pelos médios e combinações do trio da frente em zonas interiores), muito devido à preparação da equipa de Seattle para as virtudes do adversário. Brian Schmetzer preparou a sua equipa ao pormenor (algo já habitual) e não deu qualquer espaço aos adversários, posicionando a sua equipa num 4-4-1-1 muito bem definido, encurtando o espaço entre a linha defensiva e a linha média para bloquear qualquer tentativa da equipa de LA para ter bola à entrada da área.
Lodeiro posicionou-se em frente da linha média e, apesar de ter menos responsabilidades defensivas, o seu papel foi de marcar individualmente Atuesta, médio defensivo que é fortíssimo com bola e inicia quase todos os ataques dos LAFC, acompanhando-o um pouco por todo o lado e cortando a sua linha de passe.
Seattle é uma equipa fortíssima em transição, e isso notou-se ainda mais com a equipa de LAFC a tentar assumir o jogo quando passou a estar em desvantagem. Ruidiaz teve um papel determinante na equipa não só pelos golos marcados, mas também pela maneira como segurou a bola e soube desenvolver o ataque mesmo em situações de desvantagem numérica, esperando sempre pelo apoio de Morris e Lodeiro (visível no vídeo em baixo). No lado contrário, os centrais de LAFC e Atuesta (apesar da sua qualidade individual com bola, tem muito a melhorar no momento defensivo) tiveram muitas dificuldades em parar Ruidiaz, cometendo vários erros individuais que acabaram por custar caro em transição e organização defensiva, como foi exemplo o segundo golo dos Sounders:
Ao intervalo, os Sounders venciam por 2-1 e a sua estratégia resultava na perfeição. Apostar na transição, utilizar Ruidiaz e Morris como alvos e ter vários jogadores a apoiar rápido no meio-campo ofensivo. O mapa posicional ao intervalo reflete esses comportamentos de uma equipa organizada defensivamente e que aposta na transição: defesas centrais e médios centros recuados, Lodeiro (10), Morris (13) e Ruidiaz (9) em zonas mais centrais e dois jogadores bem abertos nos flancos em zonas intermédias.
Na segunda parte, LAFC tentou várias alterações na sua maneira de jogar para fazer com que Vela e Rossi fossem protagonistas, algo que acabou por não acontecer. Sem grandes oportunidades ou momentos de pressão, Bob Bradley tentou colocar os seus laterais em zonas mais interiores e isolar Vela e Rossi nas alas (com Diomandé no centro), e depois tentou juntar Vela e Diomandé no centro, numa altura onde já pouco se jogava com ideias e pensamentos claros, com muito pouco tempo útil de jogo. Seattle é uma equipa muito experiente, e passou para 12 vitórias em 12 jogos onde vencia ao intervalo, algo que mostra a organização e competência da equipa orientada por Brian Schmetzer.
Para a segunda parte, Bob Bradley alterou o posicionamento dos seus laterais (destacados na imagem) no momento ofensivo, colocando-os em zonas interiores para atrair os laterais e libertar os dois extremos: Vela e Rossi.
Nos últimos minutos do jogo, Vela e Diomandé apareceram ambos em zonas centrais, tentando o “tudo por tudo” para a equipa.
Resumo do jogo:
Conferência Este: Atlanta United – Toronto FC
Os campeões caíram num jogo que tem muito por explicar. À partida, Atlanta United era a equipa claramente favorita à vitória e foi isso que mostrou durante os 90 minutos. A jogar em casa, tendo feito mais uma excelente fase regular, a equipa de Atlanta não soube traduzir o seu domínio em golos. Erros defensivos, muita passividade com e sem bola em momentos decisivos e um conforto no jogo que não se traduziu no resultado. Antes de ir ao detalhe prático do jogo, deixo alguns dados estatísticos simples que ajudam a perceber o contexto desta análise.
Atlanta termina o jogo com mais posse de bola, mais remates, mais passes, mas apenas 3 grandes chances criadas (um golo marcado e um pénalti falhado). Do outro lado, Toronto ganha o jogo sem ter uma chance de perigo criada dentro da área, mas a não perdoar os erros defensivos de Atlanta.
As equipas apresentaram-se sem quaisquer surpresas. Comparando com o jogo da meia-final, ambas estavam na máxima força (Altidore, dos Toronto, está para já há algum tempo) e tentaram aplicar as suas características de jogo desde o início. Atlanta com posse, a ocupar diferentes espaços do campo e a confiar no seu quarteto de ataque para desenvolver o jogo a partir de zonas mais centrais. Já Toronto continuou com Pozuelo, o seu maior desequilibrador, a avançado, retirando alguma criatividade ao meio-campo e assumindo-se com comportamentos mais resguardados no seu 4-3-3 habitual.
As exibições irrepreensíveis de Gonzalo Pity Martínez e Julian Gressel (com culpas no golo decisivo do jogo) não chegaram para chegar à final da MLS Cup.
Os primeiros 15 minutos do jogo foram muito animados, com 2 golos e um pénalti defendido. Toronto apresentou-se no jogo com uma linha defensiva muito alta e foi castigado por isso. Sem pressão ao portador da bola, a linha defensiva não reagiu duas vezes e Pity Martinez acabou isolado com Westberg, resultando num golo madrugador e num penalty nos primeiros 8 minutos. O golo de Atlanta nasce de uma tentativa de pressão alta falhada da parte de Toronto (talvez a única vez que o fizeram), onde Barco aparece em zonas centrais de frente para a linha defensiva e com tempo para pensar e fazer um passe excelente para Pity Martínez.
Situação de bola descoberta, a linha não reage ao espaço dado ao portador da bola e tenta defender uma situação sem pressão à bola com 55 metros livres nas suas costas.
O lance do penalty foi bastante parecido e vindo do mesmo tipo de erro: bola descoberta (sem ninguém a pressionar), linha defensiva alta em igualdade numérica e bola nas costas da defesa, sem ninguém a acompanhar a desmarcação de Martínez entre os defesas centrais, acabando numa falta duvidosa dentro da área.
Lance 5vs5 na última linha de Toronto, que mais uma vez tentou manter o posicionamento extremamente alto e acabou por ser feliz com a excelente defesa de Westberg ao penalty de Josef Martínez.
A resposta de Toronto foi imediata, ainda antes de ter conseguido entrar na área da equipa de Atlanta. Desatenção coletiva que foi resultado de falta de comunicação e compensação na linha defensiva, com o capitão Parkhurst a seguir Pozuelo até zonas altas do terreno, sem ninguém a compensar na linha defensiva, deixando uma situação de 3vs4 (inferioridade da defesa) em zonas frontais à área. Nem Gressel (extremo direito) nem nenhum dos médios centro de Atlanta compensou Parkhurst, chegando tarde a Benezet, que resolveu com um grande remate.
Destacado o movimento do central Parkhurst, que forçou o lateral direito a fechar por dentro e deixou espaço para Benezet explorar no lado contrário onde a bola se encontrava.
Pity Martínez esteve em evidência não só nos dois lances de perigo nos primeiros 8 minutos, mas também ao longo de todo o jogo, com mais destaque na primeira parte. Aparecendo em espaços que “não são de ninguém”, entre marcações e forçando os defesas para tomarem uma decisão, o argentino explorou uma das maiores debilidades de Toronto: retirar Michael Bradley da zona à frente dos defesas centrais. Os restantes médios não compensam os movimentos de Bradley, deixando espaço para outros jogadores aparecerem entre linhas.
Michael Bradley numa das muitas situações em que se encontrou em inferioridade numérica no seu espaço preferido: em frente aos defesas centrais. Sem as devidas compensações até ao intervalo, Toronto podia ter visto consequências bem mais graves a acontecerem na primeira parte.
Com bola, e apesar da vitória, Toronto foi quase sempre inconsequente, onde trago dois motivos para essa abstenção com bola da equipa canadiana:
1) Boa preparação e organização de Atlanta no momento defensivo e de transição, quase sempre a pressionar logo após a perda e com marcações individuais no meio-campo;
2)Falta de opções ofensivas de Toronto, que com Pozuelo a avançado precisa de mais homens a fazer deslocamentos contrários ao do espanhol, que gosta de recuar para vir buscar a bola e aparecer de frente para o jogo.
1) Referências individuais na marcação de Atlanta, dando pouco espaço aos médios de Toronto para aparecerem num momento intermédio com bola.
2) Pozuelo recua para vir buscar jogo e não há uma mínima ameaça à linha defensiva de Atlanta, estando muito confortáveis sem qualquer marcação.
O jogo de Atlanta na segunda parte foi passado com bola, no meio-campo ofensivo, mas sem grandes consequências. Toronto adaptou-se sem bola, Greg Vanney soube mexer na equipa e deu poucas opções a Atlanta, que raramente entrou no bloco de Toronto, mostrando-se confortável com uma posse quase sempre inofensiva.
Os extremos de Atlanta tentavam partir de zonas interiores para os corredores, com Gressel e Barco a tentarem criar espaço para chegarem ao último terço com sucesso, com esse comportamento base da equipa demonstrado na imagem em baixo:
Jogadores do meio-campo e do trio da frente destacados, com Gressel (em desmarcação) e Barco (8) a partirem do corredor central junto a Josef Martínez (7).
Neste momento, Atlanta deve estar a perguntar-se como é que perdeu este jogo, o que é bom sinal, porque trago parte dessa resposta: passividade defensiva completa. Já nos últimos 15 minutos de jogo, numa das primeiras vezes onde Toronto sai de forma controlada para o ataque, a equipa de Atlanta reage bem na transição, obriga o atacante DeLeon a dar um toque para trás e, de um momento para o outro, todos os jogadores acharam que o lance estava resolvido e ninguém pressionou a bola à entrada da área. Resultado? Um golaço de DeLeon e passagem à final para a equipa de Toronto, que repete assim a terceira final contra Seattle nos últimos 4 anos.
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